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Problemas globais não admitem atuação isolada

Artigo da pesquisadora Ludmila Monteiro de Oliveira, vencedora de edital do Instituto Lula, defende a tributação global como fonte de financiamento para o desenvolvimento e reconstrução de um mundo melhor


Problemas globais não admitem atuação isolada

Divulgação

É urgente lançar luzes sobre uma ideia antiga, da década de 1960, pela instituição de uma tributação global para levar o financiamento para o desenvolvimento a sério e a reconstrução de um mundo melhor. A conclusão é do estudo Tributação Global como Ferramenta para o Desenvolvimento realizado pela doutora em Direito Tributário pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Ludmila Monteiro de Oliveira. A professora da PUC de Minas Gerais é uma das vencedoras de edital do Instituto Lula, de 2021, debatido na quarta-feira (30) com transmissão pelo canal do IL . O artigo foi comentado pelo professor de Direito Público da UFMG e pós-doutorado em Democracia e Direitos Humanos Onofre Alves Batista Jr.

O ponto central do trabalho, explicou a pesquisadora, é o agravamento da desigualdade, da concentração de riqueza. Com a pandemia esse quadro ficou ainda pior. “A gente começa a experimentar cada vez mais um número restrito de pessoas detendo uma fatia imensa da riqueza, seja em determinadas nações, seja analisando no espectro internacional.”

A professora lembra que a ideia de que estaríamos todos no mesmo barco, diante da pandemia, caiu por terra. E usou a tragédia do Titanic (abril de 1912) para demonstrar como essa tese de “mesmo barco” sempre foi furada. “Das pessoas que estavam na primeira classe do Titanic, menos de 40% vieram a óbito. Quando se analisa a segunda classe, esse número chega a quase 60%. Na terceira classe passa de 75%. Ou seja, estar no mesmo barco, ainda que fosse verdade, a depender de onde você está localizado, suas chances de sobrevivência são maiores. Dizer que estamos no mesmo barco parece que estamos todos na mesma situação, e isso não é verdade.”

Cada um tem uma condição diferente para enfrentar a tormenta, reforça ela. “Por mais que a gente esteja encarando um problema de ordem global, as escolhas que os países fazem não ficam mais confinadas aos seus limites territoriais”, afirma a pesquisadora. “Não temos todos as mesmas armas para lutar contra o inimigo comum, o vírus.”

Para ela, a grande lição da pandemia é demonstrar que os destinos estão todos interconectados. “Diante desses problemas globais é completamente impossível que seja feita uma atuação isolada”, diz, destacando a questão vacinal.

Assim, ressalta, viu-se o aumento da desigualdade não somente na concentração de riqueza como no número de vacinados. “Pobreza não está ligada a única e exclusivamente a uma questão econômica, medida em PIB (Produto Interno Bruto), mas também reflete questões de expectativa de vida de acordo com o país onde se nasceu.”

Tributação global

E, nesse contexto, pouco é dito sobre como as regras do regime tributário internacional atuam desfavoravelmente ao desenvolvimento. “Fica bem evidente quando a gente vê o movimento dos Estados Unidos e da Europa tentando se defender contra a erosão das suas respectivas bases tributárias. Se eles estão sofrendo, sendo os detentores de espaço e voz na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), qual seria a situação dos países em desenvolvimento, meros espectadores dessas políticas ditadas pelos países desenvolvidos que compõem a OCDE”, questiona.

O caminho para reconstruir um mundo melhor, avalia a professora, perpassa o fortalecimento das lideranças regionais das economias emergentes, para fazer frente ao controle de expertise dessas organizações de forma que esses países possam pautar o que é relevante para eles. “Não é uma lei da natureza um sistema tributário. Quando um país decide conceder benefício fiscal aquilo está por detrás de um objetivo político. Quando a gente coloca países desenvolvidos para falar de tributação em âmbito internacional sem dar espaço para as nações emergentes, estamos deixando os interesses dessas nações de lado e colocando como se os interesses dos países desenvolvidos e em desenvolvimento fossem iguais.”

Um segundo ponto para essa reconstrução, afirma ela, é reconhecer que esses deveres são de justiça, e não de caridade. “Eles precisam ser exigidos de uma maneira compulsória. Não é um favor que essas nações fazem aos países em desenvolvimento de prestar determinados auxílios.”

Não se trata de criticar a caridade, esclarece. “Esses deveres de justiça não estão presos dentro de um território. E a gente não consegue levar a sério a reconstrução de um mundo melhor sem uma fonte previsível de financiamento. E essa fonte que temos hoje mais segura, que menos rompe com o sistema hoje em vigor e seria capaz de fazer frente às demandas de direitos humanos que há tanto pactuamos, é a tributação global.”

Acompanhe o seminário

Webinários

O estudo sobre tributação faz parte do tema Desafios da Ordem Global. E é o último seminário do Ciclo de Estudos e Pesquisas que trata das Novas e Velhas Desigualdades na Era Digital. O Instituto Lula promoveu essa série de 18 webinários, exibidos ao longo de segundo semestre deste ano, que apresentam e debatem estudos aprovados em chamadas públicas realizadas pelo IL no final de 2021.

A primeira série de webinários abordou temas acerca da Soberania e Segurança na Era Digital

Segundo ciclo de webinários trata de Desigualdades: Identidades e Cuidados

O edital PesquisAção ofereceu bolsas de R$ 6 mil cada para a realização de pesquisas. Um segundo edital ofereceu bolsas de R$ 3 mil para a produção de artigos. Os contemplados agora dividem seu conhecimento com o público por meio dessa série de webinários. Além disso, serão publicados três livros com uma coletânea desses artigos e pesquisas.

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